Missa de Posse Canônica

HOMILIA DE DOM MAURÍCIO DA SILVA JARDIM

Hoje, penúltimo domingo de outubro, celebramos o Dia Mundial das Missões, instituído pelo Papa Pio XI em 1926. Com o tema ‘A Igreja é missão’ e o lema ‘Sereis minhas testemunhas’ (At 1,8) queremos recordar nossa identidade missionária. Penso que é uma feliz providência, iniciar o ministério episcopal nesta amada diocese de Rondonópolis-Guiratinga justamente neste dia. Nos sintamos, pois, em comunhão com a Igreja presente nos cinco continentes que reza e ajuda materialmente a missão universal. Nossa coleta da missa de hoje será enviada integralmente para manter um fundo mundial de solidariedade que mantém 1050 dioceses pobres na África, Ásia e América Latina.

O tema deste mês missionário nos ajuda viver nossa identidade católica. A Igreja é missão, ou seja, a missão é nosso DNA, nossa natureza e não se reduz a uma dimensão ou em algumas atividades pastorais ou algumas horas de nosso dia. Nossa vida é missão. Quando estamos no mercado, no ônibus, no trabalho, nas férias ou em qualquer atividade não deixamos a vida missionária de lado para viver uma outra vida.

Em sua mensagem para este Dia Mundial da Missões, o Papa Francisco destaca a importância do testemunho cristão. “É o ponto central, o coração do ensinamento de Jesus aos discípulos em vista de sua missão no mundo. Todos os discípulos são testemunhas de Jesus graças ao Espírito Santo que recebem: serão constituídos como tal pela graça. Por onde forem, onde quer que estejam. Assim como Cristo é o primeiro enviado, isto é, missionário do Pai (cf. Jo 20,21) e, como tal, é a sua “testemunha fiel” (cf. Ap 1,5), assim cada cristão é chamado a ser missionário e testemunha de Cristo. E a Igreja, comunidade dos discípulos de Cristo, não tem outra missão senão a de evangelizar o mundo, de ser testemunho de Cristo. A fé não nos tira do mundo. Eis nossa identidade.

Outro ponto que destaca o Papa Francisco na sua mensagem para este dia é: A missão é tarefa eclesial. Nenhum grupo, pastoral, movimento ou comunidade deve se apropriar da missão. Jesus confia aos discípulos e discípulas de ontem e de hoje: “Vocês serão minhas testemunhas”. A forma plural enfatiza o caráter comunitário-eclesial do chamado missionário dos discípulos. Todo batizado é chamado à missão na Igreja e por mandato da Igreja: portanto, a missão se realiza em conjunto e não individualmente, em comunhão com a comunidade eclesial e não por iniciativa própria. Como ensinou São Paulo VI na Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi: “A Evangelização nunca é para ninguém um ato individual e isolado, mas profundamente eclesial. De fato, não é coincidência que o Senhor Jesus enviou seus discípulos em uma missão dois a dois; o testemunho dos cristãos a Cristo tem um caráter principalmente comunitário. Daí a importância essencial da presença de uma comunidade, mesmo pequena, no cumprimento da missão. 

Continua o Papa: Além disso, é pedido aos discípulos para construírem a sua vida pessoal em chave de missão: são enviados por Jesus ao mundo não só para cumprir a missão, mas também e por precedente, viver a missão que lhes foi confiada; não só para dar testemunho, mas também e sobretudo para ser testemunhas de Cristo(Mensagem do Papa para o Dia Mundial das Missões 2022).  

Esta dimensão eclesial da missão nos leva compreender que a Igreja é sinodal. Igreja em comunhão e participação. Não há outro caminho como nos diz o Papa Francisco, “A sinodalidade é o caminho que Deus quer para Igreja deste milênio”. Exigirá de todos nós uma atitude permanente de escuta recíproca que culmina na escuta do Espírito para discernir os rumos missionários que devemos percorrer juntos. Ninguém por melhor que seja deve caminhar de forma isolada, mas em comunhão, pois a missão não é nossa, ela é de Deus e com Ele queremos cooperar.

Para este nosso caminho evangelizador na diocese penso nestas duas realidades constitutivas do ser e viver da Igreja. A sinodalidade e a missão. Colocar nossa vida e ação pastoral em chave missionária e sinodal. Não como algo optativo, mas essencial para todas as comunidades, paroquias, pastorais, movimentos, serviços, associações, congregações religiosas ou organismos eclesiais. A Igreja é missão. A Igreja é sinodal. Caminhar juntos, na comunhão e participação em vista da única missão (Missio Dei), da qual somos cooperadores e cooperadoras. 

A primeira obra missionária é sermos uma Igreja orante e de escuta. A cena do Evangelho deste domingo descrito por Lucas, justamente destaca a necessidade de uma oração que seja autêntica. Nosso Deus escuta a súplica dos pobres e humildes que diante Dele desabafam as suas precariedades e suas fragilidades a exemplo do cobrador de impostos e rejeita a oração farisaica daqueles que vão ao templo para se justificarem e julgarem as pessoas. O Fariseu vai ao templo para rezar e se apresenta com complexo de superioridade na relação com as outras pessoas. “Ó Deus, eu te agradeço porque não sou como os outros homens, ladrões, desonestos, adúlteros, nem como este cobrador de impostos. Jejuo duas vezes por semana, e dou o dízimo de toda a minha renda”(Lc 18,10). Ele representa aquelas pessoas que confiam na sua própria justiça e desprezam os outros. Esta tentação pode estar em nós quando nos julgamos superiores ou melhores que os outros. Aprendamos, pois com a oração do cobrador de impostos que batia no peito dizendo: “Meu Deus tem piedade de mim que sou pecador”. Reconhecendo nossa vulnerabilidade humana, abrimos caminho para a graça de Deus atuar. “Quando sou fraco é que sou forte”.

Me permitam algumas saudações. Saúdo e convido a vocês, cristãos leigos e leigas, para trilharmos juntos este caminho missionário e sinodal. Sei que já caminham nessa direção. Vocês são a grande maioria da Igreja e servem nas comunidades eclesiais de base, nas paróquias, nas pastorais, nas associações e nos pequenos grupos, nos movimentos eclesiais e movimentos sociais, nos ministérios a vocês confiados, no mundo do trabalho, da educação, da cultura, da saúde, da política, da segurança pública. Quanto importante é o serviço de vocês junto aos irmãos sem trabalho, sem teto e sem terra. Quero com vocês trabalhar por uma Igreja sinodal, de comunhão, participação e missão. Em julho do próximo ano nossa diocese irá acolher o 15 encontro nacional da Comunidades Eclesiais de Base. Será uma ótima oportunidade para crescermos na comunhão, participação e missão. Vamos acolher bem os que irão participar deste encontro?

Queridas consagradas Catequistas Franciscanas, Irmãs Salesianas, Irmãs da Divina Vontade e Irmãs Ursulinas. Queridos consagrados Franciscanos, OFM, Salesianos e Frades Menores Missionários. Venho me somar a vocês para trilharmos juntos este caminho missionário e sinodal à serviço desta Igreja local. Quero tão logo conhecer cada uma de suas comunidades, de seus projetos, ir lá com vocês onde estão servindo. Muitos de vocês estão entre os mais pobres dos pobres. Desejo me tornar próximos destas realidades.

Em nome do P. José Éder que foi administrador diocesano desde a Páscoa do saudoso Dom Juventino em maço do ano passado, saúdo os padres diocesanos e religiosos, chamados de “fiéis cooperadores da ordem episcopal”. Quero contar muito com vocês e quero que contem comigo para seus desafios, suas lutas, suas dúvidas, suas buscas. Quero, também, partilhar de suas alegrias. Vivamos juntos este espírito missionário e sinodal. Somos servidores de Jesus, mas ele preferiu nos chamar de amigos. Cultivemos a amizade que se nutre do evangelho. Aproveito para agradecer os presbíteros que vieram de outras Igrejas locais. Aos jovens vocacionados e seminaristas, diocesanos e religiosos, nós apostamos em vocês e queremos acompanhá-los de perto para neste caminho de discernimento a vocação presbiteral como servidores e pastores do Povo de Deus. Ao chegar na quarta feira a noite em Cuiabá, foi simbólico para mim visitar em primeiro lugar o nosso seminário maior diocesano Jesus Bom Pastor que têm 11 seminaristas residentes acompanhados pelo reitor Pe. Jhony. Lá quero voltar muitas vezes e acompanhar de perto a formação inicial de nossos futuros presbíteros.

Em nome de Dom Canísio, presidente do regional de do metropolita Dom Mário, saúdo meus irmãos bispos do Regional Oeste2, Província Eclesiástica de Cuiabá. Como é bom encontrá-los aqui. A Igreja nos confiou o serviço ao Povo de Deus destas dioceses. Que bom poder me somar aos senhores nessa missão. O Regional Oeste 2 é uma instância concreta para vivermos a sinodalidade e a missão. Caminhemos juntos cooperando na mesma missão de Deus. Sabemos que existem desafios que nos pedem unidade e comunhão. Aproveito para agradecer a presença de bispos de outros regionais aqui presentes.

Estimado Dom Giambatista Diquattro, sua presença aqui nos confirma na unidade com o Papa Francisco que recentemente encontramos e dialogamos na visita Ad Limina e no curso para novos bispos em Roma. Nos falou o Papa Francisco: “Coragem, não tenham medo. Sigam adiante na proximidade com Deus, entre vocês bispos com os presbíteros e com o povo”.

Me dirijo agora aos senhores e senhoras que receberam do povo mandatos nos municípios e no estado. Prezadas autoridades civis e militares aqui presentes.Que beleza saber que os senhores desejam caminhar juntos conosco na promoção de um mundo de justiça, paz e fraternidade. Estarei sempre aberto ao diálogo na construção do bem comum. A Política como nos ensina o Papa Francisco é a melhor forma de exercer a caridade. Desejo que continuem lutando em favor dos mais pobres e não tenham medo de investir nas periferias na defesa e promoção da vida humana da concepção até a morte natural. Agradecido pela presença de cada um dos senhores nesta celebração, rogo ao Santo Espírito o dom do discernimento que lhes é imensamente necessário no exercício do poder público. Sejam como nos apela o Papa Francisco, promotores da fraternidade e da amizade social. Aceitem minha disposição de contribuir e somar nos esforços conjuntos para ver nosso povo viver com dignidade, com seus direitos respeitados, sobretudo trabalhando pela superação das desigualdades sociais que ferem a dignidade da pessoa humana.

Uma palavra sobre o meu lema e brasão episcopal. O conjunto deste brasão expressa a natureza missionária da Igreja e sua universalidade, simbolicamente ilustrada nas cinco cores dos cinco continentes. O brasão está distribuído em três imagens que traduzem os três âmbitos interligados da missão: O cajado, a semente e o barco são imagens que recordam a imagem do pastor, do semeador e do pescador. A missão é uma só, mas se desdobra na pastoral ordinária (pastor), na nova evangelização (semeador) e na missão Ad/inter gentes (pescador). A cruz missionária indica que o ministério do bispo existe em referência ao ministério pastoral de Cristo e em continuidade com Ele. Este formato de cruz onde brotam rosas, expressam que a morte, a dor e sofrimento não tem a última palavra e sim a vida que brota do ressuscitado. O Lema: “Eis-me aqui, envia-me” (Is6,8). Inspirado no livro do projeta Isaías, indica a disponibilidade em servir, renovando o “sim” de cooperar na missão de Deus. Deus nos dá tudo e pede tudo.

Quero concluir saudando alguns irmãos e irmãs que vieram da Arquidiocese de Porto Alegre, de minha cidade de origem, Sapucaia do Sul e de Brasília, onde atuei nos últimos seis anos, como diretor da Pontifícias Obras Missionárias (POM).  Vieram aqui para me entregar à Igreja de Rondonópolis-Guiratinga. Permitam-me saudar minha mãe, Cecy da Silva Jardim, minhas irmãs e irmãos. Meu pai, Honório Jardim, nos acompanha do céu. Meus tios, tias, primos e primas, sobrinhos e sobrinhas.  Obrigado pelo carinho de vocês. Estou consciente que não sou eu que tomo posse da diocese, mas ela toma posse de mim numa relação de entrega e doação total de si mesmo. Este é meu desejo. Percorrer esta diocese me doando e servindo o Povo amado de Deus. Me ajudem manter o foco naquilo que é essencial da missão confiada por Deus.

Quero colocar meu ministério e a vida de cada um de vocês, irmãos e irmãs, nas mãos daquela que se apresentou como serva do Senhor, a virgem pobre de Nazaré, modelo para nosso serviço, Maria, nossa querida Mãe Aparecida. E faço isso com a ajuda de todos vocês rezando uma “Ave Maria”. Fiquemos de pé.

 

23 de outubro de 2022.

Dom Maurício da Silva Jardim, Bispo da Diocese de Rondonópolis-Guiratinga-MT