O PROTAGONISMO DOS CRISTÃOS LEIGOS E LEIGOS NA IGREJA E NA SOCIEDADE

Prof. Dr. Ademar de Lima Carvalho

 

Pensar a questão do protagonismo do leigo no mundo de hoje implica em refletir a  concepção de mundo, de civilização cinge o pensamento dos Cristãos na atualidade. Implica ainda mergulhar ainda  na história da Igreja, sobretudo no que se refere o seu ensinamento pastoral do Vaticano II e documentos Latino-americanos e da Igreja no Brasil.

Por outro lado, é também importante refletir sobre que compreensão de Eclesiologia, Cristologia, teologia, espiritualidade e missão na dimensão ético-política  que ilumina a ação e prática de evangelização do cristão leigo na comunidade. Mediação da ação evangelizadora no mundo.

Antes de dialogar sobre essa questão já afirmo que o protagonismo do leigo tem como foco a missão de ser semeador de esperança; testemunha qualificada do projeto do Reino de Deus; intervenção na realidade injusta, visando a construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária.

Determina revolucionária para transformação da  vida na comunidade: 1-  inclusão pelo o amor; 2- temor e prática da justiça. Porque o amor e a prática da justiça constituem o de mais original do protagonismo dos leigos na igreja e sociedade.   O Evangelho de Jo 15, 9-17 enfatiza que Jesus nos chama para dentro do amor, para que assim possamos administrar e gerenciar a nossa vida pelo ato amoroso. Porque diz D. Erwin a missão “é caminho, é itinerância de busca. É proclamação de esperança e denuncia de toda injustiça. É escuta e testemunho. É uma radical entrega da própria vida ao Projeto de Deus”.

Da mesma forma, ainda é importante dizer que o Vaticano II (LG) a igreja é estabelecida como o Povo de Deus. Partindo do entendimento de uma eclesiologia a partir do povo de Deus. Assim a “Igreja caracterizada como o próprio Reino de Deus ela passa a ser sinal, sacramento, instrumento desse Reino”. Daí deduz que para a Igreja ser plenamente igreja, torna-se necessário que os leigos  e leigas se constituíssem plenamente como sujeitos eclesiais para exercer sua missão recebida no Batismo.

Igreja, diz o Documento nº 100 da CNBB (98-100) é comunidade. A comunidade torna a igreja visível. A comunidade eclesial é o lugar de educação da fé.  A CEBs é uma forma privilegiava de vivência comunitária da fé, inseridas no seio  da sociedade em perspectiva Profética (Diretriz CNBB, n.102; DAP n. 178-80).  Diante da realidade do mundo atual  o Papa Francisco afirma que […] não quero uma igreja preocupada com ser o centro, e que acaba presa em um emaranhado de obsessões e procedimentos” (EG 49). Quero uma Igreja em saída (EG 20) Igreja em estado de missão (DAP 213). A igreja organizada a partir das Cebs configura como novo jeito de ser igreja , que leva a sério a participação e caminho de todos os batizados tem respaldo bíblico-teológico.

A questão real é que a imensa maioria do povo de Deus é construída de leigos. Seguir Jesus Cristo é o primeiro passo para se tornar discípulo  e missionário (DAP 278; 131)- Imita o exemplo de Jesus e dar testemunho. Ser sal da terra e Luz do mundo (Mt 5,13-14). Portanto, o protagonismo dos cristãos leigos nas CEBs – igreja e sociedade- tem como suporte básico o seguimento de Jesus Cristo Libertador, por que a igreja missionária se abastece do profetismo.

Protagonismo significa: principal personagem. Pessoa que desempenha papel e função principal num acontecimento. Aquele que recebe a condição de sujeito. Logo, para o desenvolvimento de seu protagonismo  na igreja e sociedade o cristão leigo precisa tomar consciência que é sujeito ativo e membro do Povo de Deus. Para tanto necessita de formação, conhecimento e vivência da espiritualidade do projeto de Jesus cristo histórico e libertador.

O sentido e seguimento do protagonismo do cristão leigo na igreja e sociedade se sustentam na espiritualidade encarnada, na entrega total a causa missionária. Isso implica um grande amor a Jesus Cristo e paixão pelo seu Reino.

O cristão leigo na igreja e sociedade somente constitui um sinal de libertação se tiver imbuído do compromisso de sujeito organicamente engajado na CEBs para mover o ser humano como um todo no envolvimento nos valores  do projeto do Reino de Deus. Lembre-se que o missionário está sempre inserido numa comunidade.

O sujeito da missão é a igreja comunidade. A igreja missionária se sustenta no protagonismo dos cristãos leigos envolvidos na missão. A vivência do evangelho se dar na comunidade, por que é aí que as pessoas vivem, partilha a vida. É na comunidade que “acontece a exclusão e a não participação de pessoas que a compõem”.

Refletir sobre o protagonismo dos cristãos hoje, tem um sentido e um significado muito importante  para os leigos, porque nos obriga a olharmos no retrovisor da história para compreendermos quem somos hoje e ao mesmo tempo visualizar o para-brisa aberto para um futuro ao ser construído  pelo protagonismo da igreja em estado de missão.

Pode-se então dizer que para a Igreja povo de Deus e Leigo no mundo, o marco referência é o vaticano II (LG 1, 8-9; GS) – Lumen Gentium (Igreja povo de Deus), Gaudium et Spes (foca sobre a igreja no mundo de hoje), seguido de Medellín, Puebla, Aparecida.

Diz o texto base da CF/2015, o retorno aos documentos da Igreja a partir  vaticano II é fundamental para o exercício do protagonismo dos Cristãos leigos, tendo em vista que  aí está o marco referencial de reconhecimento como sujeito, bem como os “ensinamentos que nos levam a ser uma igreja atuante, participativa, consoladora, misericordiosa, samaritana. Sabemos que  todas as pessoas que formam a sociedade são filhos e filhas de Deus. Por isso, os cristãos trabalham para que as estruturas, as normas, a organização da  sociedade esteja a serviço de todos”. “A comunidade dos fieis, os cristãos, é uma igreja  em saída. As comunidades de base e pequenas comunidades, movimentos constituem a riqueza da Igreja”. ‘“Os cristãos são presença do Evangelho na sociedade”.

Pensando na sociedade- mundo contemporâneo. Na tessitura do vaticano II, o mundo com o qual dialogou, configurado pela chamada modernidade. A modernidade – iluminismo séculos XVII e XVIII-é a crença no progresso contínuo e na construção de uma história cada vez melhor. É o período que o homem toma para sai construção do próprio paraíso- É a construção do homem racional. A modernidade  transforma a civilização da produção de mercadoria.

O fato é que a Igreja vive e precisa dialogar com o mundo em transição para outra época. Hoje a partir da crise da modernidade o mundo passa por transformação, estamos diante da mundialização globalizada configurada na esfera da pós-modernidade. Diz o vaticano II que igreja está inserida nessa realidade como sinal de salvação (LG) e como servidora da humanidade (GS). Diante do contexto do mundo, ontem, hoje e sempre é preciso caracterizar um posicionamento eclesiológico.

O protagonismo dos cristãos leigos e leigas na igreja e sociedade,  em mudança e crise de paradigma, como disse antes, precisa de uma razoável formação teológica, cristológica, eclesiologia e pastoral, faz-se necessário construir uma visão de mundo, porque os documentos da Igreja afirmam que o mundo da política também é um precioso lugar de missão do cristão. É importante estudar na comunidade: O que diz a palavra de Deus sobre a relação igreja- sociedade: Povo de Israel, Jesus e a organização da sociedade de seu tempo? O que você conhece da relação igreja e sociedade á luz de seu magistério? O que fala a igreja na America latina sobre a opção pelo ser humano e opção preferencial pelos os pobres?   (ter estudos da CNBB- cristãos leigos e leigas na igreja e sociedade).

O mundo contemporâneo está envolto em desafios. No caso do Brasil estamos marcados por profundas mudanças, no aspecto: demográfica, urbanização, econômica e sua articulação com as políticas publicas, violência, minorias etc.(EG, p.47-75, estudos da CNBB- 107, cap I)

Diante de uma realidade social de crise no sistema de representações para o exercício do dinamismo do protagonismo dos cristãos leigos é fundamental discernimento a luz da Palavra de Deus, Teologia e ciências humanas e sociais.

No campo das representações religiosas é muito forte a determinação da postura assumida a partir de uma visão intimista de fé como a mesma lógica conduzida pelo projeto neoliberal de sociedade com o foco no individuo e negação do sujeito coletivo. Há uma volta a ideia cristã antes do vaticano II de uma visão de Igreja como sociedade perfeita focado no clericalismo e dês-foco do leigo. O que na linguagem popular chamamos de estética da batina.

O texto base preparatório do encontro do laicato de 2012, destaca que  neste tempo de crise de representações religiosas em que as pessoas se perguntam sobre a razão de sua existência, sente que o sentido da vida tem a ver com uma profunda aspiração religiosa. Porém nos dias atuais, “ o conceito de salvação sofreu um processo de materialização e passou a ser entendida como cura”. A exortação Evangelii Gaudium (n.6) assim manifesta “na cultura dominante, ocupa o primeiro lugar aquilo que é exterior, imediato, visível, rápido, superficial, provisório. O real cede o lugar á aparência”.

Hoje a fé católica de muitos  povos está sendo problematizada pelo “desafio da proliferação de novos movimentos religiosos, alguns tendentes ao fundamentalismo e outros que parecem propor uma espiritualidade sem Deus” (EG 63, 78). Como superar a visão religiosa pressa à aparência, o superficial, a exterioridade do formalismo com predominância o aspecto administrativo, sacramentalização sobre o pastoral sem a profundidade que se requer essencialidade da evangelização no cristianismo?  

Diz Antoniazzi que neste momento histórico  da crise da modernidade que “a compreensão de nossa relação com Deus sofre uma inversão. Em lugar de servir a Deus, a religião passa a servir-se de Deus, transformada num espaço para a resolução de problemas pessoais, consolo, compensação”. O que tem marco o tempo presente, por um lado,  é a busca de um sagrado sem religião, por outro, a “ religião passou a ser uma mercadoria a ser vendida a um público alvo específico, que  deve ser abordado da forma adequada, estabelecida por marqueteiros, fazedores de opinião”. O cristianismo tem um produto primordial para ser vendido a esse mercado: o cristo da fé descolado do Jesus cristo histórico libertador. A lógica é fidelizar o individuo, de diferentes maneiras, desde a sobrevivência seja percebida  no universo de aglomerado de massa.

O que o texto – base do CNLB está dizendo é “ o cristianismo é uma religião, mas também uma completa visão de mundo. E está visão de mundo está também em crise, que se localiza na necessidade de uma  nova forma de diálogo com novas realidades e os novos anseios que surgem da crise civilizacional”. Penso que aqui está a encruzilhada do protagonismo dos cristãos leigos e leigas na igreja e sociedade. Acredito que os sinais dos tempos apontam para um ressurgimento das CEBS com mais vigor, porém alicerçada a uma eclesiologia a partir do povo de Deus como novo jeito de ser igreja, sobretudo uma igreja no mundo urbano. Uma Igreja pobre com os pobres. Uma cristologia a partir da prática de Jesus que revela o Reino. Uma teologia do espírito entendido a partir do evento de Jesus (DAP 33).

Na singela compreensão a realidade de nosso tempo, o protagonismo dos leigos na igreja e na sociedade, deve ser compreendido como um para-brisa que se abre ao horizonte do mundo que precisa ser construído. Mas, o compromisso e ação evangelizadora dos leigos para transformar em mais ardorosa, alegre, ousada precisa ser  reconduzido  ao caminho da teologia e espiritualidade da libertação, porque o protagonismo dos leigos não sobrevive se renunciar ao realismo da dimensão social do Evangelho. (EG 201) “a vocação e missão próprias dos leigos é a transformação das diversas realidades terrenas para que toda a atividade humana seja transformada pelo evangelho, ninguém pode sentir-se exonerado da preocupação pelos pobres e pela justiça social”.

Para a Exortação Gaudium (88),  […] “o evangelho convida-nos sempre a abraçar o risco do encontro com o rosto do outro, com a sua presença física que interpela, com os seus sofrimentos e suas reivindicações, com a sua alegria contagiosa permanecendo lado a lado. A verdadeira fé  no Filho de Deus feito carne é indispensável do dom de si mesmo, da pertença á comunidade, do serviço, da reconciliação com a carne dos outros. Na encarnação, o Filho de Deus convidou-nos á revolução da ternura”. Logo, “a tarefa da evangelização implica e exige uma promoção integral de cada ser humano”. Neste sentido, “todos os cristãos, incluindo os pastores, são chamados a preocupar-se com a construção de um mundo melhor”. Assim uma “fé autentica- que nunca é cômoda nem individualista-  comporta sempre um profundo desejo de mudar o mundo, transmitir valores, deixar a terra um pouco melhor depois de nossa passagem por ela” (EG 182-183). O protagonismo dos cristãos leigos na igreja e sociedade é “ser um sinal de esperança que brota do coração amoroso de Jesus cristo”.

(Estudo de Prof. Ademar de Lima Carvalho no I Encontro Interdiocesano de CEBs realizado em Primavera do Leste-MT nos dias 16 e 17 de maio de 2015)

 

ANEXO: Para refletir em grupo:

1 – Como construir uma identidade cristã libertadora frente ao pluralismo ético-cultural na sociedade atual?

2 – O que diz e pode dizer a boa nova de Jesus Cristo para o protagonismo dos cristãos leigos na igreja e sociedade?

3 – Como os cristãos leigos estão desenvolvendo o seu protagonismo nas comunidades e movimentos da igreja? 

4 – Que desafios os cristãos leigos estão encontrando para dinamizar o seu protagonismo na igreja e sociedade?

 5 – O que significa ser cristão leigo para nós hoje?

6 – Que ação concreta os cristãos leigos, a partir desse encontro, pode desenvolver para  dar visibilidade na igreja e sociedade o seu protagonismo?

7 – O Reino de Deus anunciado por Jesus é central para a vida cristã e missão da igreja Povo de Deus no mundo. O que podemos fazer hoje para dar visibilidade ético-política a esse projeto na sociedade? 

8 – No documento de Aparecida, leigos e leigas são chamados luz do mundo (n. 209-215), o que fazer para que essa luz não se apague na comunidade?

9 – O que pode ser feito de concreto para dinamizar o protagonismo dos cristãos leigos/as no mundo da política?

10 – Quem são os cristãos leigos e leigas de hoje?