Línguas diferentes

Dom José Alberto Moura
Arcebispo de Montes Claros (MG)

Falar e compreender uma língua requer convívio com quem a usa, estudo e exercitação. A aprendizagem mais natural e fácil é a feita desde criança. A melhor aprendizagem não é a tradução mecânica mas a que faz a pessoa pensar com o sentido da linguagem aprendida.

 

No texto bíblico, narrador da Torre de Babel (Cf Gênesis 11,1-9), é apresentada a realidade das pessoas que falavam a mesma língua, mas tinham um projeto de construção de auto-afirmação, buscando a superioridade como se atingisse a Deus com a própria engenharia. Só houve confusão e os fabricantes da torre não se entenderam mais. Foi um verdadeiro contra-senso. Falavam a mesma língua para o início da obra. Mas se desentenderam por causa do orgulho e da ambição.

O ser humano pode até aprender várias línguas, mas não entende o semelhante quando se fecha no próprio ensimesmamento, contrariando o projeto de Deus. Há confusão, injustiça generalizada, falta de cooperação e amor fraterno. Inventa religiões para tentar um encontro com Deus. Mas, por si mesmo não consegue seu intento se não for humilde, verdadeiro, tendo reta intenção de realizar o projeto divino em sua vida. Deus só quer o bem de seus filhos. Mas estes precisam demonstrar a aceitação do projeto do Criador, na vida de entendimento, boa vontade de valorizar os dons de cada um e ver, principalmente, o que é bom no próximo para apoiá-lo em seus pendores de benefício a toda a sociedade.

Precisamos, mais do que tudo, de nos entender com a linguagem do amor. É muito importante aprender tal linguagem desde criança, para nos imbuir do espírito do amor divino.

O novo Pentecostes nos dá a graça de falarmos, com os “sotaques” diferentes, mas nos entendendo e nos unindo nos pontos comuns, que são maiores dos que os divergentes. As religiões não podem ser vivenciadas com métodos e atitudes de se querer impor aos demais as próprias convicções, destruindo os outros em nome da fé em Deus. O Criador não precisa dos ritos e cultos humanos. Estes podem ser bons quando são manifestação da vontade humana de se relacionar com Deus de modo humilde, sincero e agradecido. A fé de cada um, conforme sua religião, sempre deve ajudar as pessoas se unirem como seres humanos civilizados, que querem cooperar com a vida terrena na convivência sincera de contribuição com o bem de todos. A proposta religiosa de cada um deve ser assumida com convicção, mas apresentada com a devida liberdade de aceitação por parte dos outros. Nós, cristãos, devemos viver nossa fé com convicção e testemunhá-la na prática do amor.

O ecumenismo, ou diálogo entre cristãos de diversas comunidades religiosas ou Igrejas, bem como o diálogo entre religiões também não cristãs, não significa sincretismo religioso, ou mistura de religiões. São modo inteligente e fraterno de entendimento e aceitação do outro com seus valores e tradições, para uma convivência humana construtiva do bem estar da sociedade, com promoção da justiça e da paz. O respeito às diferenças é fundamental para tal encaminhamento.

Se não conseguimos ainda uma unidade maior, que não se confunde com uniformidade, precisamos ter atitude de avanço no diálogo e mútua compreensão. Deus, na pessoa do Espírito Santo, nos ajudará a nos unir mais e conviver com as diferenças para que elas resultem na expressão da linguagem do amor. Então tudo se tornará mais possível e fácil de se conquistar em entendimento e verdadeira fraternidade. Afinal, Deus julgará a todos não porque são desta ou daquela religião e sim porque verá o esforço de cada um para viver a lei e a linguagem do verdadeiro amor. Sozinhos temos a tentação de querermos realizar tudo contando só com nossas forças. Paulo nos ensina: “Também o Espírito vem em socorro da nossa fraqueza” (Romanos 8, 26).