Dom Erwin Kräutler apresenta realidade dos povos indígenas

O bispo do Xingu (PA) e presidente do Conselho Indígena Missionário (Cimi), dom Erwin Krautler, apresentou aos bispos, reunidos na 53 Assembleia Geral,  a situação atual dos povos indígenas e quilombolas. O texto é longo e traz, com linguagem clara, os grandes e graves problemas que ameaçam a vida dos povos indígenas. A exposição foi a última que dom Krautler  fez a uma assembleia da Conferência uma vez que termina, no próximo setembro de 2015, seu quarto mandato no Cimi.

“Tomo mais uma vez a liberdade de descrever o avanço da dura e conflitiva realidade dos povos indígenas no Brasil. Faço-o no intuito de não apenas relatar atos e omissões, dados e números, mas sim de tocar o coração dos pastores e de todos os homens e mulheres da nossa Igreja”, disse dom Erwin no início de sua exposição. Ele lembrou uma afirmação feita pelo embaixador  Rubens Ricupero feita durante a análise de conjuntura que apresentou aos bispos na semana passada: “A sociedade brasileira será julgada pela maneira como trata os mais fracos e frágeis”.

O presidente do Cimi considerou que se faz necessário conhecer de perto quem são esses “fracos” e “frágeis” no Brasil e mais ainda, quais são as causas e os motivos de sua vulnerabilidade. “São sempre pessoas de carne e osso. E entre elas sobressaem os indígenas, os verdadeiramente autóctones deste país maravilhoso. Já milhares de anos atrás seus antecedentes longínquos habitavam esse continente. Muitos têm sobrenomes que identificam o povo a que pertencem. São mulheres e homens, crianças, jovens, adultos, idosos, feitos à imagem e semelhança de Deus a quem são negados os direitos fundamentais à vida, às suas terras ancestrais e de serem diferentes em seus costumes e tradições, culturas e línguas”, explicou.

Dom Erwin disse que não quer falar de fatos do passado, mas do que está,dom Erwin 53ag 1 (1)efetivamente acontecendo com os povos indígenas e quilombolas neste momento no País.  “Tento mostrar o calvário de 305 povos indígenas tratados como estrangeiros em seu próprio país e acusados até de usurpadores de suas terras tradicionais ou então de invasores de propriedades produtivas”, denunciou. Para dom Erwin, “apesar dos duros golpes que sofreram e continuam sofrendo, a esperança de que um dia o sonho da Terra sem Males se torne realidade, não desvanece. É o sonho de um mundo justo, fraterno e solidário, onde todos podem viver em harmonia com a criação de Deus e seus semelhantes”.

O governo também recebeu avaliação negativa na exposição do presidente do Cimi. “O atual governo ao favorecer abertamente os ruralistas mostra-se intransigente para com os povos indígenas e quilombolas. Não aceita diálogo com líderes indígenas e rejeita qualquer questionamento ou crítica aos seus planos e projetos desenvolvimentistas. Essa postura arrogante estimula a perseguição e as violências contra os povos indígenas”, avaliou.

A respeito do poder Legislativo, dom Erwin fez uma consideração a respeito do que tem sido uma decepção em relação ao que afirmou a Constituição de 1988 sobre os povos indígenas. “Alastram-se Projetos de Lei e Propostas de Emenda Constitucional no intuito de abolir direitos de indígenas e quilombolas e de romper com qualquer perspectiva de demarcação de terras. E não é só isso. A bancada ruralista chega até a propor a revisão das terras já demarcadas e homologadas pela Presidência da República. São propostas tramitando no Congresso que sorrateiramente tentam corromper todo o espírito da Constituição Federal de 1988”, disse.

Uma outra denúncia feita pelo presidente do Cimi diz respeito à Funai. “O esvaziamento da Funai está relacionado aos acordos firmados com os setores da economia contrários aos direitos dos povos indígenas. O primeiro mandato da presidente Dilma terminou com o menor índice de demarcações da história dos governos desde a redemocratização. O desinteresse do governo federal pelo órgão e pela questão indígena fica ainda mais evidente com a redução do quadro de funcionários permanentes. Há, além disso, uma severa restrição orçamentária para o órgão indigenista”, acrescentou.

No final de sua exposição, dom Erwin agradeceu: “Hoje é a última vez que, como presidente do Cimi, me dirijo aos bispos do Brasil porque no próximo setembro termina o meu derradeiro mandato. Agradeço de coração as notas da CNBB ao longo de todos estes mais de trinta anos em favor dos direitos e da dignidade dos povos indígenas”.