Tabor: um novo olhar

Estamos no segundo domingo doa quaresma. Tempo de preparação para a celebração da Páscoa da ressurreição. A cor dos paramentos e do espaço celebrativo é roxa, sinal de alerta, de conversão.

A Campanha da Fraternidade com tema “Fraternidade e Vida: Dom e Compromisso” e o lema “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (Lc 10-33-34) buscando estimular a o olhar compassivo com o irmão caído à beira da estrada. À luz da Palavra de Deus e da Doutrina Social da Igreja quer indicar para o sentido da vida como dom de Deus e compromisso que se traduz no cuidado com a pessoa, na família, na comunidade, na sociedade e no planeta, nossa Casa Comum.

O Texto Base da Campanha da Fraternidade nos números 19 e 20 nos ensina: “Jesus é o verdadeiro bom samaritano que se aproxima dos homens e das mulheres que sofrem e por compaixão} lhes restitui a dignidade perdida. A encarnação é sinal concreto da proximidade de Deus que salva aqueles que jazem nos sofrimentos. A perspectiva do Paraíso eterno orienta a vida ainda no momento presente e convida os homens e as mulheres a terem em si os mesmos sentimentos que estão no coração misericordioso de Cristo apresentando assim o anúncio do reino de Deus e ressignificando a vida humana como dom e compromisso.

“O próprio Jesus é o modelo dessa opção evangelizadora que nos introduz no coração do povo. Como nos faz bem vê-lo perto de todos! Se falava com alguém fitava os seus olhos com uma profunda solicitude cheia de amor: ‘Jesus fitando-o com amor’ (Mc 10, 46-52). Vemo-lo disponível ao encontro} quando manda aproximar-se o cego do caminho (Mc l0, 21) e quando come e bebe com os pecadores (Mc 2,l6) sem se importar que o chamem de comilão e beberrão (Mt 11,19). Vemo-lo disponível quando deixa uma prostituta ungir-lhe os pés (Lc 7,36-50) ou quando recebe de noite Nicodemos (Jo 3,1-15). A entrega de Jesus na cruz é apenas o culminar desse estilo que mareou toda a sua vida. Fascinados por esse modelo queremos inserir-nos a fundo na sociedade partilhamos a vida com todos} ouvimos as suas preocupações colaboramos material e espiritualmente nas suas necessidades alegramo-nos com os que estão alegres choramos com os que choram e comprometemo-nos na construção de um mundo novo} lado a lado com os outros. Mas não como uma obrigação nem como um peso que nos desgasta mas como uma opção pessoal que nos enche de alegria e nos dá uma identidade” (EG) n. 269).

A palavra de Deus (Mt 17,1-9) nos convida para “subir à montanha, fazer a experiência da transfiguração, escutar o Filho amado de Deus para depois descer para junto ao povo, ao sofrimento, à dor e gemidos da humanidade para ser presença anunciadora da vida em Jesus Cristo. Há hoje uma tendência de subir e fazer três tendas e dizer: “Como é bom ficarmos aqui”, longe dos pobres, da violência, dos desafios da vida, da realidade concreta de cada dia. Mas é para este mundo que Deus nos criou e em Jesus nos chamou para a missão. A voz de Deus na montanha ressoa até hoje; “Escutai-o”. Escutar e seguir Jesus Cristo. Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida. Escutar os clamores dos irmãos que necessitam de uma palavra, de um sorriso, de acolhida.

O rosto de Jesus tornou-se luminoso, brilhante, sinal da vida novo, do novo céu e da nova terra. E quem escuta o Filho amado de Deus tem seu rosto transfigurado pela esperança, vida, ética, amor, liberdade, vida. O biblista Sérgio Bradanini assim reflete: “O rosto luminoso de Jesus revela a sua verdadeira identidade aos discípulos para que, depois da ressurreição, possam entender que o rosto resplandecente do Ressuscitado é o mesmo do Jesus Crucificado. Com efeito, somente à luz da Páscoa eles entendem quem é realmente Jesus e o sentido de sua morte. Assim como o sol é a fonte da luz e “faz ver” as coisas como elas são, a luz da transfiguração de Jesus “faz ver” a sua identidade messiânica: revela a divindade em sua humanidade. Aqui os discípulos ouvem a voz de Deus chamando Jesus de “Filho”, e, durante a paixão, ouvem Jesus chamando a Deus de “Pai”. Neste monte, a humanidade de Jesus deixa transparecer a sua divindade e, no Getsêmani, a divindade assume plenamente a sua humanidade”.

“Este é o meu Filho bem-amado, em quem coloco todo o meu amor; escutai-O”… “É o meu Filho, por Ele tudo foi feito e sem Ele nada foi feito” (Jo 1,3). O Filho de Deus não se apropriou dessa igualdade que tinha com o Pai, não reivindicou o seu direito, mas, sem deixar a glória divina, humilhou-se até à condição de servo e obediente até a morte e morte de cruz. Mas Deus o ressuscitou (Fl 2,6). Nele encontramos a vida, a salvação. A Ele podemos escutar, abraçar e nos aproximar. “Deus não somente ama, mas também quer ser amado”. Tabor, lugar revelador dos grandes mistérios de Deus e dos mistérios do coração humano. As experiências mais significativas e as revelações mais profundas vêm do Tabor, do Sinai, do Oreb, do Calvário, do Sermão da Montanha, da Colina de Roma. Tabor, mistério de Deus, mistério do coração humano. Revelação de Deus, revelação do humano que se encanta com o horizonte, com a brisa, com o silencio. Tabor, caminho a subir, mas horizonte a contemplar. Olhar mais longe. Descobertas, novas motivações.

No alto do monte Tabor, Pedro falou: “Senhor, que bom seria ficarmos aqui, quer que façamos três tendas”. Por vezes este também é o nosso desejo.  Cansados de viver no meio da multidão, nos afazeres do dia a dia, da realidade que nos cerca e dos compromissos inerentes, temos desejo de “ficar no alto da montanha, ir à beira do rio ou ir ao sítio e ali fazer tenda, isolar-se”. Não ter preocupação com o outro, com a comunidade, com a missão da Igreja, com os doentes, como a solidariedade com os irmãos. Necessitamos de silencio, de descanso, mas não isolar-se à vida inteira para fugir dos compromissos.

Com a Igreja rezemos a oração da Campanha da Fraternidade 2020. “Deus, nosso Pai, fonte da vida e princípio do bem viver, criastes o ser humano e lhe confiastes o mundo como um jardim a ser cultivado com amor. Dai-nos um coração acolhedor para assumir a vida como dom e compromisso. Abri nossos olhos para ver as necessidades dos nossos irmãos e irmãs, sobretudo dos mais pobres e marginalizados. Ensinai-nos a sentir a verdadeira compaixão expressa no cuidado fraterno, próprio de quem reconhece no próximo no rosto do vosso Filho.

Inspirai-nos palavras e ações para sermos construtores de uma nova sociedade, reconciliada no amor. Dai-nos a graça de vivermos em comunidades eclesiais missionárias que, compadecidas missionárias que, compadecidas vejam, se aproximem e cuidem daqueles que sofrem, a exemplo de Maria, a Senhora da Conceição Aparecida e de Santa Dulce dos Pobres, Anjo Bom do Brasil. Por Jesus, o Filho amado no Espírito, Senhor que dá a vida. Amém

Que o Sagrado Coração de Jesus, patrono da Diocese, derrame abundantes graças e bênçãos sobre cada um de nós. Saúde aos doentes, alegria aos tristes, esperança aos desanimados.

 

 Dom Juventino Kestering,

Bispo diocesano.